sexta-feira, 27 de abril de 2012

#Vazio - A Fome das Sombras (18)


- Enfim! Eu não o quero como um vegetal! Não me agrada nenhum pouco vê-lo terminar seus dias em um leito de hospital, sonhando com aventuras em um deserto distante e abandonando a grande aventura da vida real.

- Não sei mais o que é vida real!
- É para isto que estou aqui! Tenho que seguir com você neste caminho árduo para recolocar tudo no lugar! Realidade na realidade e sonhos nos sonhos!
- Não tem medo que “tudo no lugar” seja você nos sonhos e eu no deserto?
- Estou certo que não sou um sonho!
- Não estou certo de nada!
Marcus ficou impressionado com a precisão com que suas experiências no deserto estavam descritas em seu caderno. Não compreendia como poderia escrever com tanta desenvoltura sem sequer estar consciente de que o fazia. Aquilo parecia intrigar até mesmo o médico, que explicou já ter visto situações semelhantes, mas jamais tão profundas e extensas quanto as de Marcus. O médico decidiu deixar que o paciente descansasse até o almoço. Pediu que evitasse dormir ou cochilar e o encorajou a andar pelo quarto. As costas ainda ardiam muito, bem mais do que no deserto, e ainda estavam envoltas em curativos, os quais foram habilmente substituídos por uma enfermeira um pouco antes do almoço. No almoço, para a alegria de Marcus, arroz integral e omelete. Ele comeu sorrindo e se perguntando se deveria agradecer “pela” omelete ou “pelo” omelete. Bebeu suco de laranja e comeu sua gelatina com satisfação. Pouco depois de terem recolhido a bandeja Dr. Willian retornou ao quarto.
- Desculpe-me! Fiz de tudo para obter sashimi para você, mas não tive sucesso!
Desta vez Marcus riu.
- Pensei que estivesse lendo meu caderno. Não aguento mais sashimi!
- Pelo contrário! É claro que estou! Por isto mesmo imaginei que suas experiências com o peixe fossem alguma manifestação de um desejo inconsciente pelo mesmo!
- Se eu estava desejando isto, não estou mais! Já comi muito peixe!
- Ok! Anotado! Nada de peixe! Mas para pararmos de vez com o peixe você precisa parar de vez com suas fugas para o deserto, não?
Marcus riu de novo.
- Não são fugas, doutor! São... Como posso dizer? Elas acontecem!
- “Involuntárias”, deve ser a palavra que busca, não?
- Isso! Involuntárias! Eu durmo aqui e vou pra lá! Durmo lá e venho pra cá! Cada mundo é o sonho do outro!
- Mas uma coisa interessante aconteceu nestes passeios, não?
Marcus não compreendeu! Era difícil imaginar qual de todos aqueles acontecimentos era o “interessante” eleito pelo médico.

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